Decreto nº 1102, de 21 de Novembro de 1903
EXPOSIÇÃO SOBRE O ESTABELECIMENTO DE ARMAZÉNS GERAIS E
EMISSÃO DE TÍTULOS, BILHETES DE DEPÓSITO E WARRANTS
Quando o Governo Federal expediu o Decreto nº 1.746, de 13/10/1869, escrevemos algumas notas sobre aquele decreto, as quais acolhidas com distinta gentileza pelo digno proprietário e redator do "O Direito", foram publicadas no volume 77, págs. 5, 161 e 321, e no volume 81, pág. 5, desta excelente a apreciada revista.
Falamos, então, das vantagens e do conceito econômico e jurídico dos armazéns gerais. Salientamos os defeitos da nossa fragmentada legislação a respeito dos títulos especiais emitidos por estes institutos, sobre mercadorias em depósito, para facilitarem operações de compra e de crédito, e demos ligeira idéia sobre as vendas públicas voluntárias de mercadorias por atacado. Dissemos, também, que a instituição do crédito sobre mercadorias não podia facilmente medrar entre nós, porque, não surgindo organicamente com o grande comércio e sendo completamente alheia aos nossos hábitos mercantis, da lei que a disciplinasse tudo dependeria.
A Cia. Docas de Santos, aparelhou-se para emitir aqueles títulos especiais de depósito e de crédito sobre a imensa fortuna acumulada em seus vastos entrepostos; o Governo, para a execução do art. 29, nº 23 e 24, da lei nº 746, de 29/12/1900, designou armazéns da Alfândega da Capital Federal e da estação marítima da Estrada de Ferro Central do Brasil para nele serem recebidas mercadorias de importação ou quaisquer outras de produção nacional, não sujeitas a deterioração ou explosão, e que se destinassem a servir de base à emissão de conhecimentos de depósito e warrants.
O resultado foi nulo.
O nosso comércio não conhece a instituição; as leis que temos a esse respeito são mancas e incompreensíveis. Por outro lado, não há bancos para o movimento dos warrants; as próprias empresas autorizadas pelo art. 11 do decreto 2.502 a fazer empréstimos contra warrants sobre mercadorias depositadas em seus estabelecimentos e a negociar aqueles títulos, não se animaram a entrar nestas operações.
O que aconteceu estava previsto. Instituições como esta, que se relacionam intimamente com o crédito, não são aceitas, sem que o comércio apreenda a sua utilidade e segurança. Ninguém aventura capitais em negócios cujo alcance e mecanismo desconhece e cujas probabilidades de sucesso ignora. Instituições tais não se improvisam nem podem ser impostas e para prestarem os serviços a que se destinam devem ir cautelosamente conquistando terreno com a confiança que souber inspirar e à medida das necessidades e exigências do tráfico mercantil.
O desenvolvimento entre nós da instituição dos armazéns gerais necessita de propaganda. E o primeiro trabalho consiste em afastar o preconceito que a tem prejudicado naqueles países onde foi estabelecida legislativamente.
Os armazéns gerais não produzem a riqueza: à riqueza existente dão útil engrandecimento. Daí a observação do preclaro Vidari: "A instituição e uso daqueles estabelecimentos estão em proporção do desenvolvimento econômico dos países onde existem. Não nos deixemos embalar, escreve o notável professor, pelas fáceis e fatais ilusões de que os armazéns gerais por si só fazem prosperar o comércio onde este não ofereça já aquele suficiente alimento. Acautelem-se todos contra os cegos entusiasmos, e não estabeleçam armazéns gerais senão nos lugares onde, com evidência, se manifesta a sua necessidade; do contrário às ilusões sucederá inevitavelmente a ruína". - (Corso de Diritto Com., vol. 4, 4ª edição. nº 3.940).
Nas condições atuais do comércio e da indústria, o crédito representa papel proeminente; obter crédito sobre mercadoria, ao invés de denunciar uma situação embaraçosa, significa atividade, prudência, habilidade e tino de quem dele se serve. Lançar mão deste crédito é aparelhar-se, como bem diz NAVARRINI, para sustentar vitoriosamente a luta da concorrência.
O crédito real proporcionado por meio de armazéns gerais tem sido, com muita propriedade, equiparado ao crédito imóvel, pois se, de uma parte, oferece solidez na garantia, de outra qualquer que seja o sistema de emissão dos títulos, o ônus, que grava as mercadorias faz-se conhecido de quem a queira adquirir. (Elbermann, Lagerhauser und warrants, pág. 14).
O comerciante, o produtor têm mercadorias a vender. Os preços do mercado são baixos; há, entretanto, probabilidade de próxima alta. A negociação do warrant facilita um adiantamento sobre o preço.
Manifestada a alta e vendida definitivamente a mercadoria, o comerciante ou o produtor paga a dívida e embolsa o saldo que lhe dá o preço da venda. Economicamente falando, a negociação do warrant, diz Dubron, não representa, por si só, um todo completo e acabado; é a primeira parte de uma operação que, se chama venda (Docks et warrants, pág. 159). Venda sobre warrant, escreve Maurice Block, é assim que deve ser designada a operação, e não empréstimos sobre mercadorias. Convém arredar do warrant a idéia de empréstimo sobre penhor. (Introd. A DAMASHINO, Magazin Généraux, pág. XXIX).
É preciso levar o warrant, a não ser principalmente um instrumento de empréstimo sobre penhor, pondera por sua vez ALIX SAUZEAU, mas um instrumento de circulação das mercadorias e desde logo de compra e venda - (Manuel des Docks, des Vents Publics et des warrants, pág. 127).
Tal é a tendência moderna e da qual já falamos n "O Direito", vol. 77, pág. 168 e segs., em que pese ao eminente Edmond Thaller, que vê, na apreciação que acabamos de fazer uma análise contrária aos princípios dominantes da matéria (Traité Elementaire de Droit Com., n. 1.388). Na verdade, sobre o ponto de vista rigorosamente jurídico assim é. A lei não pode deixar de falar em empréstimo sobre penhor, e buscar na disciplina deste instituto as regras fundamentais que têm de presidir a circulação do warrant.
Com as enormes vantagens que a instituição oferece, mobilizando os grandes capitais empregados em mercadorias, regulando as relações entre a oferta e a procura, afastado fica o preconceito a que já nos referimos. O warrant poderá competir vantajosamente com as letras de câmbio e de terra: estas repousam sobre o crédito pessoal do devedor e dependem da solvabilidade deste na época do vencimento; aquele é um título de crédito real e pessoal ao mesmo tempo, não satisfeito no vencimento, o credor pagar-se-á sobre o produto da venda das mercadorias. Não bastando este produto, recorrerá à obrigação solidária dos endossantes. Com tais garantias a taxa do juro será suave.
Para completar a obra da propaganda é indispensável que o poder legislativo venha ao encontro do comércio, oferecendo-lhe uma lei simples em seus termos, e bastante segura para evitar que, logo em começo, os tropeços criados por exigências inúteis e inconvenientes e os artifícios que a fraude sabe criar, não desacreditem e mutilem o belo instituto.
Consusbstancia-se no projeto, que acompanha esta exposição, o que de melhor nos parece estar admitido pela legislação de outros países e pela doutrina de escritores conscienciosos. Nesta matéria nada se pode criar. O trabalho é todo de adaptação ao nosso meio, e, enquanto a prática não nos der os seus valiosos ensinamentos e não vier polir a obra, outro remédio não há senão acolher e aproveitar aquilo que a experiência de nações comerciais oferece como modelo.
No estabelecimento dos armazéns gerais é, sem dúvida, preferível o regime liberal, compatível com os nossos hábitos comerciais e com o preceito do art. 72, § 24, da Constituição Federal. Fiquem aqueles institutos dependentes da iniciativa privada, sem o menor caráter oficial. Eles nascerão, desenvolver-se-ão e prosperarão sob a mais absoluta liberdade, da qual nos dá notícia a história do comércio inglês e holandês. A esse respeito já expendemos razões n "O Direito", vol. 77, pag. 321.
O projeto simplifica e facilita quanto possível a fundação de empresas de armazéns gerais, auxiliando a sua formação mesmo nos centros de importância secundária onde se manifeste a necessidade de tão poderoso elemento para o desenvolvimento da riqueza. Entretanto, os grandes interesses ligados à instituição aconselham cautelas, a que o projeto atende, mais ou menos idênticas àquelas que o Código impõe aos empresários de armazéns de depósito e de trapiches.
Estas cautelas visam garantir a veracidade dos armazéns gerais, rodeá-los da mais ampla publicidade e submetê-los à efetiva fiscalização.
Quem quiser estabelecer a empresa, basta fazer perante a Junta Comercial do distrito, onde tenham de ser situados os armazéns, as declarações enumeradas no art. 1º do projeto, e apresentar o regulamento interno e a tarifa remuneratória dos serviços que se propõe prestar ao público.
A Junta Comercial, verificando que o regulamento interno está de acordo com a lei, procede a matrícula do pretendente no registro público do comércio, e, por editais, anuncia aos interessados aquelas declarações, o regimento interno e a tarifa. Assinando, depois, o termo de responsabilidade, como fiel depositário, está o empresário habilitado para receber em depósito gêneros e mercadorias e sobre eles emitir títulos que os representem.
O decreto nº 596, de 19 de julho de 1899, conferiu às juntas comerciais a faculdade de conceder a matrícula dos trapicheiros e administradores de armazéns de depósito e a expedição de seus títulos (art. 12, § 1º), de cassar esta matrícula quando conseguida sob e sub-repticiamente (art. 12, § 13), e de inspecionar os trapiches alfandegados e seus livros, e impor multas aos administradores dos mesmos trapiches nos termos do Código Comercial.
Os estados têm mantido estas Juntas com as mesmas atribuições do decreto nº 596, confiando-lhes o registro público do comércio, instituído pelo art. 10, nº II do Código Comercial. Nessas condições, não era possível dispensá-las do serviço que lhes comete o projeto, conquanto se possa objetar se é lícito aos poderes da União conferir atribuições a estas corporações, desde que, por errônea inteligência da Constituição Federal, têm sido consideradas ramo da justiça dos estados ou repartições deles dependentes.
Quanto às companhias de docas, aos concessionários de entrepostos e trapiches alfandegados, já habilitados para o depósito de mercadorias estrangeiras sujeitas a direitos de consumo ou de importação, outras são as condições exigidas para que possam emitir conhecimentos de depósito e warrants. Em virtude dos grandes interesses da Fazenda Nacional dá-se, então, a ingerência administrativa. A autorização para emitir aqueles títulos é concedida e o regulamento interno é aprovado pelo governo, por intermédio do Ministério da Fazenda. Uma das mais abundantes fontes de emissão daqueles títulos será sobre mercadorias de importação estrangeira; estas, descarregadas diretamente nas docas, entrepostos ou trapiches alfandegados, com a sua condição de origem garantida, poderão entrar desde logo no comércio, sem deslocação.
O dono terá facilidade de obter recursos para o pagamento dos direitos fiscais, proporcionando-se-lhe mesmo a ocasião de vender as mercadorias e apurar o lucro antes de satisfeitos queles impostos.
Para que o comércio, nos lugares onde não existam empresas de docas, aproveite as vantagens da instituição, o governo poderá designar as alfândegas, que, oferecendo condições para o serviço, devam emitir os referidos títulos, os quais ficam equiparados aos dos armazéns gerais estabelecidos e custeados por empresas particulares.
Compreende-se que, para a viabilidade da emissão de títulos sobre mercadorias de importação estrangeira, é indispensável a maior largueza de tratamento aduaneiro, a par do mais completo acautelamento dos interesses fiscais. O projeto deixa todas as providências a cargo da administração federal, à qual incumbe das instruções sobre o respectivo serviço nas alfândegas e aprovar o regulamento interno das docas, entrepostos e trapiches alfandegados. Mais adiante tornaremos ao assunto, dizendo o que se nos afigura de mais prático a respeito da emissão dos títulos sobre aquelas mercadorias.
Os armazéns das estradas de ferro prestam-se a oferecer também valiosíssimos serviços ao comércio, e as leis fiscais já permitem mesmo o seu alfandegamento. (Cons. das Leis das Alfândegas, art. 242). O projeto estabelece a disposição do art. 3º se a estrada é da União; se é mantida e custeada por empresas particulares, ficam estas sujeitas às exigências do art. 1º, devendo, porém, apresentar prévia licença do governo que fez a concessão e que a fiscaliza; esta licença tem por fim evitar que a empresa, com o sacrifício do tráfego a seu cargo, se entregue a outra ordem de serviços.
O projeto esforça-se por colocar o armazém geral no regime de inteira publicidade. São publicadas pela imprensa as declarações de que trata o art. 1º, o regulamento interno e a tarifa, os quais não sofrerão modificação sem novas publicações. O regulamento interno e tarifa serão fixados na porta dos armazéns gerais e na sala de vendas, e distribuídos, gratuitamente, exemplares impressos aos interessados que os solicitarem. Na impossibilidade de adotar o sistema consagrado na lei da Finlândia, de 1892, de manter junto aos armazéns gerais um fiscal pago pela respectiva empresa e de nomeação oficial, sistema que parece o mais prático, porém oneroso, para as empresas, o projeto confia a fiscalização a quem ordenou a matrícula ou concedeu autorização, e obriga as empresas de armazéns gerais a apresentarem balancetes trimestrais e um relatório e balanço completo anual, disposições essas com o seu símile nos arts. 89 e 90 do Código Comercial.
Vivendo os armazéns gerais neste regime de liberdade temperada pelo público interesse, de publicidade e de fiscalização, poderão todos avaliar as forças da empresa, sua honorabilidade e garantia, e só deixará iludir quem quiser. A aceitação dos títulos, que emitirem, dependerá da confiança que infundirem.
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Os armazéns gerais recebem em depósito mercadorias ou gêneros de produção nacional ou estrangeira, que o seu dono ou consignatário queira, ou não, vender de pronto, ou tenha a intenção de exportar, reexportar ou fazê-las por ali simplesmente transitar.
Somente as alfândegas, docas, entrepostos e trapiches alfandegados guardam mercadorias estrangeiras sujeitas a imposto de consumo ou de importação.
Os armazéns gerais, compreendendo as docas, que recebem também mercadorias de exportação (lei nº 1.746, de 13/10/1869 - art. 1º), não se limitam, de ordinário, a guardar a mercadoria e entregar títulos que a representem no comércio, conquanto seja este o seu principal objeto. Podem ter a seu cargo operações e serviços mais ou menos relacionados com o depósito; podem mesmo exercer o comércio de consignação. Assim, o despacho nas alfândegas e repartições estaduais, o ajuste de fretes por mar ou por terra, respeitados os privilégios dos corretores, o serviço de transporte para o depósito, os tráfegos, as misturas, os benefícios, ensaques, manipulação e mudança de envoltórios das mercadorias e quaisquer outros serviços que tenham por fim facilitar as relações do comércio e navegação com a empresa. Alguns dos serviços e operações acima declarados são contemplados na lei nº 559, de 31/12/1898, art. IX, § 1º, letra "b", e outros na consolidação das leis das alfândegas art. 224, a respeito dos entrepostos e trapiches alfandegados.
A Cia. de Docas de Santos, na conformidade de seus estatutos de 1898, tem também por objeto o comércio de comissões.
Em Paris, onde se contam atualmente cento e cinquenta empresas de armazéns gerais, é digno de menção o armazém nº 8, dos Magazins Generaux de Saint Dénis, que apresenta uma aperfeiçoada instalação para peneirar e alvejar o trigo. O entreposto de Aubervilliers tem montada uma serraria mecânica para preparar madeira e assoalhos. Entre nós podem-se estabelecer armazéns gerais, por exemplo, com máquina para limpar e escolher o café, e que façam o ensaque e a liga. O projeto fala genericamente sobre estes serviços, exigindo apenas que o empresário declare quais os que propõe prestar ao comércio.
Tratando-se de misturas, benefícios, manipulação, etc., das mercadorias, é possível que estas operações modifiquem a sua natureza e condição. Se, pois, sobre elas forem emitidos o conhecimento de depósito e o warrant, os quais devem sempre representar fielmente as mercadorias depositadas, aquelas operações só poderão ter lugar a pedido do portador dos dois títulos. Com as mercadorias de importação ainda sujeitas a direitos deve, então, haver a maior cautela na guarda dos interesses da Fazenda Nacional.
Além deste serviços, há um, importantíssimo, reputado mesmo como fundamental aos armazéns gerais - as vendas públicas. Podem, pois, os empresários, ter anexas aos armazéns gerais salas para esse fim.
Voltaremos ao assunto mais adiante.
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Para evitar abusos, o projeto lembra que os armazéns gerais devem tratar a todos, que os procurarem, com a maior imparcialidade; nenhuma mercadoria será preferida a outra: nenhum depositante a outro depositante.
A mesma imparcialidade deve ser mantida quanto às tarifas. É em virtude deste princípio dominante na matéria que aqueles armazéns se dizem gerais. "Le magazin généraux nest pas un bazar de gros; tout au moins il ny vise pas. II est general parce quil doit ces services à tous ceux qui les reclament et que la meconnaissance de ce principe amenerait sans doute les plus grandes perturbation dans le monde commerciale". (Dubron, Docks et Warrants, págs. 50/51).
Não pode também o armazém geral recusar a mercadoria, sob pretexto da pessoa do depositante, sua profissão ou comércio. A recusa só é permitida nos casos no art. 8º, §2º, justificáveis por si. Nem é o armazém geral obrigado a exigir a prova da propriedade da mercadoria da qual o depositante se apresenta como dono ou mandatário. Sobre este assunto tornaremos quando falarmos da emissão dos títulos.
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O projeto ocupa-se também da guarda das mercadorias in genere, isto é, mercadorias da mesma natureza e qualidade, pertencentes a diferentes depositantes e que são misturadas, perdendo a sua individualidade. Nos armazéns gerais da Escócia ensaiou-se com bom resultado esta prática no comércio de ferro, e logo depois a Inglaterra e a Holanda a adotaram para os produtos coloniais (café, chá, tabaco, açúcar bruto, peles curtidas, guano e metais). Estas mercadorias armazenadas a granel nas docas são vendidas em lotes e sobre elas emitidos warrants. A França adota-a no depósito de óleos e farinhas; a América do Norte para os cereais.
Para mercadorias da mesma qualidade, esta prática economiza espaço e trabalho na sua guarda e nos transbordos dos navios para os armazéns e vice-versa.
O depósito irregular feito nos armazéns gerais tem um caráter excepcional. A propriedade da mercadoria depositada permanece pró - indiviso com os depositantes. (Vivante, Tratatto di Diritto Commerciali - vol. III, nº 1.287 - Navarrini, II magazine generali, nº 48).
Deve-se atender principalmente à intenção dos contratantes; os depositantes permitem ao depositário restituir-lhes outra tanta quantidade de mercadoria da mesma qualidade, mas não o autorizam a se apropriar dela. Aquela intenção torna-se inequívoca no sistema do projeto, que proíbe as empresas de armazéns gerais negociarem ou especularem sobre gêneros ou mercadorias que recebem em depósito. Das leis que conhecemos, só a russa de 1888 (arts. 47 a 54) regula detidamente a matéria, em cujas disposições se inspirou o projeto. Segundo este, os armazéns devem ter acomodações próprias e se aparelhar para o bom desempenho desta espécie de depósito. O armazém não pode ser utilizado pelo público, sem prévia verificação por profissionais, nomeados pela Junta Comercial ou pelo governo, qual tenha a seu cargo a fiscalização. As mercadorias serão seguradas em nome da empresa do armazém geral, e esta responde pelas perdas e deteriorações ou vícios intrínsecos da mercadoria, ainda mesmo no caso de força maior. Os títulos emitidos, além das enunciações comuns, declararão mais a qualidade da mercadoria, que o administrador do armazém geral tem por dever verificar. O armazém geral não é obrigado a restituir a mesma mercadoria recebida. Pode entregar mercadoria da mesma qualidade. Nos casos de abandono da mercadoria pelo vencimento do prazo do depósito, ou de não pagamento da dívida do warrant, podem-se vender, em lugar das mercadorias depositadas, mercadorias da mesma qualidade
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O projeto deixa à liberdade do empresário organizar o regimento interno dos armazéns. É impossível apresentar um tipo uniforme para eles, atendendo à diversidade de condições do lugar onde se estabeleçam e dos serviços a que se proponham. A lei limita-se a fixar tão - somente os princípios gerais. O essencial é que neste regulamento não se enfraqueçam as garantias e responsabilidades definidas pela lei.
Isso examinarão as juntas comerciais, ou o governo, quando tiver de intervir com a sua aprovação nos casos declarados no projeto.
Serão nulas as disposições regulamentares que contravierem à lei.
Para as tarifas dá o projeto também plena liberdade às empresas de armazéns gerais. Se exageradas, encontrarão corretivo na concorrência. O essencial é que o comércio, antes de se utilizar dos serviços oferecidos pela empresa, conheça o preço a pagar. Nada de surpresas.
A questão de tarifas é muito séria. Por um lado, delas é que as empresas de armazéns gerais tirarão a remuneração do seu capital, o alimento para sua vida; por outro lado, sem tarifas módicas, a instituição não pode prosperar. Um dos escopos dos armazéns gerais é diminuir para o depositante as despesas com a guarda das mercadorias. (Vide "O Direito". Vol. 77 pág. 10, n. 5).
Tudo isso merece ser bem pesado por quem pretender estabelecer armazéns gerais; foi por essa razão que, no começo desta exposição, com a autoridade do eminente Professor Vidari, aconselhamos toda a cautela na fundação dessas empresas e bem entendida prevenção contra os cegos entusiasmos. A empresa somente pode viver nos centros que lhe ofereçam elementos de manutenção.
A tarifa das armazenagens das alfândegas não pode ser mantida para as mercadorias sobre as quais se emitam conhecimentos de depósito e warrant.
É uma tarifa pesadíssima, e seu fim é apressar a retirada da mercadoria dos entrepostos aduaneiros. Precisa ela sofrer radical modificação; ser animadora, suave e justa. A isso atenderão o governo nas instruções que der para o respectivo serviço nas alfândegas, e as empresas de docas, entrepostos e trapiches alfandegados, nas tarifas que organizarem.
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O projeto dispensa fiança que as leis de alguns países exigem e que o decreto nº 2.502 impunha para a abertura dos armazéns gerais:
Primeiro, porque a fiança importa um sacrifício para a empresa, e todo o empenho consiste em favorecer a fundação desses estabelecimentos e lhes economizar os elementos de prosperidade;
Segundo, porque, para ser eficaz, deveria a fiança corresponder ao valor das mercadorias depositadas, e exigir isso é o mesmo que criar para imolar a instituição.
Acresce que o projeto proibindo aquelas empresas negociarem sobre os seus títulos tornou perfeitamente dispensável a fiança.
É preferível o sistema italiano, que o projeto adota: ao invés de fiança, os armazéns gerais ficam sob ativa fiscalização das juntas comerciais ou do governo, quando a autorização for deste.
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Às empresas de armazéns gerais fica proibido fazer por conta própria ou alheia o comércio de gêneros e mercadorias da natureza dos que se propõe receber em depósito. Estas empresas precisam inspirar a maior confiança, e o portador dos títulos por elas emitidos deve ter a certeza de que a mercadoria existe fielmente guardada. Convém que a empresa se conserve e posição de neutralidade; é, acima de tudo, depositária. Convém arredar suspeitas. A proibição, entretanto, deve ser entendida nos seus devidos termos. O empresário de armazéns gerais pode ser consignatário das mercadorias, expedidas por mar ou terra, fazê-las vender na sala de vendas públicas, etc., como já dissemos anteriormente. O que se lhe veda é o depósito das mercadorias pertencentes a ele, e as negociações sobre estas mercadorias.
Proíbe-se também aquelas empresas emprestarem por conta própria ou alheia, sobre mercadorias depositadas em seus armazéns ou no de outras empresas, sob penalidade no caso de transgressão deste preceito.
A esse propósito escreve Aliz Sauzeau: - "As instituições de docas, warrants e vendas públicas não são instituições de crédito, mas somente instrumentos de crédito, preparo para o crédito, boas condições para servirem à abertura de crédito, excelentes materiais para o exercício de um estabelecimento de crédito. Em uma palavra, estas instituições não fazem senão tornar a mercadoria no estado mais favorável para entrar em relações com o crédito. (Manuel des Docks, pág. 141)
Devem ser separadas as funções de depositário das de banqueiros ou capitalista, para prevenir abusos fáceis, imprimir máxima confiança nos títulos e evitar que os armazéns gerais dissimulem as casas de empréstimo sobre penhores que, de ordinário, aparecem como parasitas da instituição dos warrants.
Talvez fosse bem lembrado, no ensaio da instituição, conferir aos armazéns gerais a faculdade de fazerem empréstimos contra warrants, sobre mercadorias depositadas em seus estabelecimentos, conforme se vê no decreto nº 2.502, art. 11.
A exposição de motivos da lei francesa de 1.810, que confere essa permissão, argumenta com as vantagens de multiplicar o capital oferecido às mercadorias consignadas, e de simplificar a operações para o consignatário, que acharia na empresa o depósito e, ao mesmo tempo, o dinheiro de que precisasse, e também com a necessidade de facilitar e provocar mesmo a criação destes úteis estabelecimentos. E um dos meios tendentes a esse fim seria oferecer aos esforços da empresa, aos riscos que toma sobre si, as mais completas compensações; e a faculdade de emprestar sobre as mercadorias depositadas, e negociar os warrants que elas representam, deve ser o melhor e mais enérgico estimulante.
Os inconvenientes são, porém, muito grandes e a autorização necessitava ser rodeada de cautelas que estorvariam a fundação dos armazéns gerais. A empresa poderia, com muita facilidade, abusar do crédito e ser arrastada pela torrente da especulação; poderia também ser impelida a emitir warrants, declarando mercadorias não existentes, a especular sobre mercadorias a ela confiadas, a cometer desvios, a, finalmente, descontar warrant ou de valor fictício, criando altos empréstimos com garantia de um penhor nulo ou fraco. Não têm sido poucos os desastres que tais fraudes têm causado. (Vide Michel, Les magazins généraux et les garanties nécessaires á leur fonctionnemente, no Economiste Français de 7 de junho de 1890).
Quando, em 1882, se acentuou na Áustria a necessidade da completa reforma das suas defeituosas leis sobre armazéns gerais, as câmaras de comércio e indústria declararam que os armazéns gerais se haviam impopularizado naquele país, porque exerciam o comércio das mercadorias monopolizando os empréstimos sobre elas. (Lyn-Caen, Anuaire de Legislation Etrangére, 19º ano, pág. 342).
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As obrigações e responsabilidades das empresas de armazéns gerais são as do depositário em geral, e nesta parte o projeto reproduz mais ou menos as disposições dos arts. 91 e 93 a 95 do Código Comercial. É bem de ver que aquelas empresas não respondem pelas qualidades intrínsecas das mercadorias, exceto quanto às mercadorias "in genere", ou pelos conteúdos dos volumes recebidos fechados, salvo ao depositante, a prova de que foram abertos. Também não respondem pelo peso, quando este não for verificado no ato do recebimento da mercadoria. Prevalece a disposição do art. 88, nº III, segunda parte, do citado Código.
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A mercadoria não pode ficar infinitamente nos armazéns gerais. A empresa tem de se manter com as armazenagens e retribuição dos serviços que prestar, está em seu interesse perceber o mais brevemente possível o que lhe é devido. Daí a necessidade da fixação de um prazo máximo para dentro dele a mercadoria ser retirada. Pelas nossas leis fiscais o prazo do entreposto é de seis meses para as mercadorias suscetíveis de corrupção e de três anos para as demais, podendo os inspetores da alfândega conceder prorrogações secessivas até mais três anos, se o estado das mercadorias garantir o pagamento integral dos direitos e despesas de armazenagem, embarque, etc., etc. (Consolidação das Leis das Alfândega, art. 201).
Não é possível manter idêntica disposição para as mercadorias sobre as quais se emitam conhecimentos de depósito e warrant; retardará, sem necessidade, não só o pagamento dos direitos fiscais, como a percepção das armazenagens e das outras vantagens que constituem a renda da empresa. O projeto estabelece o prazo de seis meses, ficando salvo aos contratantes estipularem outro maior; para as mercadorias sujeitas a impostos de importação, o prazo de seis meses poderá ser prorrogado até mais um ano pelo Inspetor da Alfândega, se o estado das mercadorias oferecer garantias ao pagamento integral dos impostos, despesas de armazenagens e outras. Se as mercadorias se acharem nas docas ou nos entrepostos particulares e trapiches alfandegados, a prorrogação depende também do consentimento do depositário, que, como interessado, tem direito a ser ouvido.
A par das responsabilidades que define, o projeto concede às empresas de armazéns gerais o direito de retenção para garantia não só das armazenagens como de todas as despesas de conservação da mercadoria e ainda das operações e serviços prestados à mesma mercadoria, das comissões e juros, dado o caso de consignação.
Esse direito de retenção pode ser oposto a terceiros.
Cumpridas as formalidades legais, está a empresa de armazéns gerais habilitada a emitir títulos de efetiva representação das mercadorias que tenham em depósito. O projeto adota o sistema do duplo título, hoje geralmente aceito. (Veja-se "O Direito", vol. 77, pág. 331, nº 36). Os títulos, escritos na mesma folha, mas separáveis à vontade são denominados conhecimento de depósito e warrants.
Força é reconhecer que se a primeira expressão define perfeitamente a verdade das coisas, a segunda está longe disso. (Vejam-se as considerações que a esse respeito fizemos n "O Direito", vol. 77, pág. 330, nº 35). As leis italianas, russa e húngara dão ao nosso warrant a denominação de nota ou boletim de penhor; o Código Comercial Português a de cautela de penhor.
O projeto mantém o nome de warrant, que o decreto nº 2.502 também empregara não só por ter sido adotado desde a lei de 13 de outubro de 1869, como para de todo afastar o preconceito que podia acompanhar a expressão nota ou cautela de penhor.
Conquanto unidos em sua origem, são dois títulos entre si perfeitamente independentes; separados e aplicados às funções a que se destinam, forma cada qual um documento completo e com vida própria.
Os dois títulos, quando reunidos nas mãos de um só portador, conferem a este o direito de dispor com toda liberdade da mercadoria depositada. O cessionário, no caso de transferência, terá o mesmo direito do cedente, direito de livre disposição, compreendendo-se nesta frase não só o direito de propriedade, como o mandato para vender ou para receber a mercadoria.
O warrant separado do conhecimento de depósito é destinado a conferir ao portador um direito real de penhor sobre a mercadoria nele especificada até a concorrência da quantia enunciada no seu primeiro endosso.
O conhecimento de depósito confere ao seu portador o direito de disponibilidade da mercadoria com a limitação pelo direito de penhor constituído sobre esta mercadoria pelo endosso do warrant correspondente. O conhecimento de depósito, separado do warrant, escreve Navarrini, transfere a disponibilidade das mercadorias, diminuída, porém na sua eficácia concreta pelo fato de o armazém geral deter as mercadorias também por conta do possuidor do warrant ou do credor pignoratício, para tutelar o direto de crédito deste. (Ob. Cit. nº 105). O endosso do só conhecimento de depósito nas operações que, por seu intermédio, se realizam entre o endossador e o endossatário, representa na frase de GOLD SCHMITD (Handbuch, pág. 719 e 774, nota 30), repetida pelo professor A. Ranella (Titoli allordine, vol. 2, nº 108), a chave do armazém que os endossadores passam sucessivamente uns aos outros; assemelha-se o conhecimento de depósito ao conhecimento do frete, como o armazém ao navio do porto.
Como se vê, o warrant serve de instrumento de crédito sobre mercadorias; o conhecimento de depósito, de meio de circulação das mercadorias. (RAMELLA, ob. Cit. vol. II, nº 90).
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A emissão dos títulos é feita a pedido do depositante da mercadoria, e à ordem dele ou de terceira pessoa. De terceira pessoa porque o depositante pode já ter vendido a mercadoria com a obrigação de fazê-la depositar, ou o dono pode fazer depósito por mandatário.
A emissão dos títulos é uma faculdade concedida ao depositante, excluída assim a idéia de obrigatoriedade. O depositante é quem o solicita. O depositante pode não precisar desses títulos e se contentar com o recibo das mercadorias depositadas. Este recibo (art. 88, nº II, do Código Comercial) serve tão-somente para prova do depósito, não fica sujeito à disciplina da lei dos armazéns gerais e, portanto, não tem o mérito de representar a mercadoria e muito menos o de ser transferidos por endosso. Este recibo será recolhido ao armazém por ocasião da entrega do conhecimento de depósito do warrant correspondente, e a todo tempo é lícito ao dono da mercadoria entregar estes dois títulos e obter aquele recibo. Deste assunto cogitará, em seus detalhes, o regulamento interno dos armazéns.
O administrador do armazém geral não tem de exigir do depositante provas da propriedade ou da livre disponibilidade da mercadoria. A boa-fé deve ser sempre presumida e seria criar dificuldades para o depositante e contrariar o princípio jurídico - em referência aos móveis a posse vale título - como ofender a disciplina do contrato de depósito, no qual o depositante não é obrigado a provar ao depositário a sua propriedade ou a livre disposição sobre a mercadoria.
Por sua vez, o portador do conhecimento de depósito e do warrant, devidamente endossados, quando o seja, tem o direito de receber as mercadorias, sem necessidade de provar que é o verdadeiro dono ou mandatário. Quando se tratar, porém, de mercadorias de importação recolhidas nas alfândegas, docas, entrepostos e trapiches alfandegados, os seus donos ou consignatários são o princípio, em regra desconhecidos por ser caso de depósito necessário. Então cumpre observar as disposições das leis aduaneiras. Os títulos sobre mercadorias de importação recolhidas àqueles estabelecimentos não deverão ser emitidos sem preceder o processo do despacho de consumo, por cuja ocasião ficará provado perante a alfândega quem seja o legítimo dono, cabendo toda a responsabilidade sobre quem já a tem por direito. (Consolidação das Leis das Alfândegas, art. 476 e 477, parágrafo 1º).
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Em poucas linhas, diremos o que nos parece mais prático para a emissão dos títulos sobre mercadorias estrangeiras sujeitas a direitos de consumo ou de importação.
Tomaremos para exemplo a Cia Docas de Santos, que, com seus vastos e bem seguros entrepostos, já se acha habilitada para o serviço de emissão daqueles títulos, auxiliando as praças de Santos e São Paulo.
Formuladas as notas para despacho daquelas mercadorias em três vias, declarará nelas, assinando, o interessado: "para emissão do conhecimento de depósito e warrant, ficando o pagamento de direito a cargo da Cia Docas de Santos, no ato da entrega da mercadoria". Rubricada esta declaração pelo Inspetor da Alfândega, seguirá o despacho o seu processo regular até a conferência para determinação da dívida fiscal. A importância desta dívida será mencionada pelo conferente nas três vias do despacho, ficando este conferente responsável por seus erros e omissões. A primeira e segunda vias do despacho terão o destino que lhes dá a Consolidação das Leis das Alfândegas e a terceira ficará em poder da Cia Docas . (Decreto nº 1.286, de 17-2-1893, art. 15) e servirá de aviso da responsabilidade que esta companhia assume.
A Cia. Docas obriga-se a entregar, por ocasião da retirada da mercadoria, a importância dos direitos ao tesoureiro da alfândega, que passará recibo e rubricará a terceira via do respectivo despacho. Da entrega destas quantias dará a companhia semanalmente comunicação ao Inspetor da Alfândega, com ofício enviado com protocolo.
Verificado o quantum dos impostos a pagar e emitidos os títulos sobre as mercadorias despachadas, não pode mais ser ele alterado; o despacho presume-se liquidado. A ação da Alfândega para haver qualquer erro descoberto na revisão não será sobre a matéria, mas sobre o despachante ou dono, que as despachou, tal como se pratica nos despachos ordinários quando a mercadoria já saiu do entreposto e passou no comércio a terceiros. Tornaremos bem claro o nosso pensamento: a Fazenda Nacional será credora tão-somente dos direitos previamente declarados nas diversas vias do despacho, especialmente na terceira via em poder da Cia. Docas e que servirá de base para as enunciações dos títulos.
Se é consignada a quantia da dívida do warrant, se a mercadoria é vendida, a pedido do dono ou para pagamento da dívida do warrant, ou no caso de abandono, a Fazenda Nacional, credora privilegiada, é paga imediatamente pela companhia.
Esta responsabilidade da Cia. Docas para com a Fazenda Nacional, pelos impostos devidos pelas mercadorias cujos depósitos assumem para emissão de conhecimentos de depósito e warrants, não é uma novidade. Na Inglaterra ela existe (Custon Consolidation act. 16, 17. Vict. Cap. 107 s. VIX); a Itália também a adota (lei sobre armazéns gerais, de 17 de dezembro de 1882, art. 10).
Como medida suplementar convém que se determine o prazo de 48 horas, no máximo, para o expediente do despacho daquelas mercadorias e a determinação do imposto a pagar. Seria ainda de vantagem que ao inspetor e empregados aduaneiros se impusesse uma pena administrativa, quando, dentro do prazo, não cumprissem aquele dever.
Outrossim, só deve ser permitida a emissão de títulos sobre mercadorias em perfeito estado de conservação, que possam suportar, sem perigo de diminuição em seu valor, o prazo máximo de depósito.
Sobre as mercadorias estrangeiras que já tenham pago os direitos de importação ou sobre as de produção nacional nada tem a Alfândega; tais mercadorias devem ser depositadas em armazéns separados dos que contiverem mercadorias sujeitas àqueles direitos, e entram no regime comum.
Os títulos (conhecimento de depósito e warrant) são extraídos de um livro de talão, devendo conter as indicações do art. 15 do projeto.
Conforme se verá neste artigo, somente são contempladas as enunciações estritamente necessárias para firmarem a responsabilidade da empresa e garantirem a identidade da mercadoria.
Dentre essas enunciações sobressaem:
1º - a indicação do segurador da mercadoria e o valor do seguro.
O projeto torna obrigatório o seguro contra incêndio das mercadorias destinadas a servir de base à emissão daqueles títulos. Ele adota o sistema austríaco, cujo fim é valorizar o título com pequena despesa. As companhias de seguros, no seu interesse, saberão estabelecer prêmios módicos, atendendo à grande quantidade de mercadoria a segurar. Não há inconveniência, ao contrário, será vantajoso que este seguro fique a cargo da empresa do armazém geral, a qual pode ter apólices coletivas ou especiais para esse fim.
2º - a declaração de estar a mercadoria depositada sujeita a impostos fiscais e outros encargos, e desde que dia correm as armazenagens.
São dívidas estas que preferem à dívida do warrant e devem ser conhecidas dos portadores dos títulos. Além dos direitos fiscais, as mercadorias podem estar sujeitas a encargos, tais como à importância do frete (artigos 117 e 527 do Código Comercial); a despesas de salvação (art. 738, do Código Comercial); as declaradas nos arts. 626 e 627 do Código Comercial, as despesas a que se refere o art. 189 do mesmo Código, etc., sem esquecer a despesa de conservação e de benefício da mercadoria.
Contrariamente ao decreto nº 2.502, não se exigem:
a) - A declaração da qualidade da mercadoria.
Tal declaração tornaria difícil a posição do armazém geral, provocando sérios atritos entre este e o depositante; seria inútil, porque a qualidade da mercadoria é circunstância que somente pode ser apreciada pelo seu dono e pelo negociador do título.
Praticamente as partes procedem à avaliação da mercadoria por si ou por pessoa entendida.
b) O valor da mercadoria, formalidade custosa, porque a avaliação traz despesa, inútil porque o valor corrente ou mercantil depende da relação entre a procura e a oferta, isto é, cresce ou diminui na razão direta da primeira e na inversa na segunda, é, por conseguinte, variável; inconvenientíssima, porque obriga o negociante, ao revender a mercadoria, a por ante os olhos de quem a deseja comprar, o preço pelo qual adquiriu ou o preço da avaliação. O portador do conhecimento de depósito e do warrant denuncia assim o lucro ou prejuízo que vem a experimentar.
O projeto limita-se a declarar os elementos do título; quanto ao modelo deixa às empresas escolherem aquele que melhor satisfaça, a seu juízo, os preceitos legislativos. O mesmo procedeu o Código Comercial com as letras de câmbio, bilhetes à ordem, conhecimentos de frete, e o decreto de 1890 quanto aos bilhetes de mercadorias.
À presente exposição acompanha, com simples curiosidade, um modelo próprio para a Cia. Docas de Santos, organizado de acordo com as bases do projeto.
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Com a emissão dos títulos representativos da mercadoria, a empresa deixa de possuir a mercadoria depositada em nome do depositante como tal, para continuar uma posse a favor do possuidor do título que se apresenta formal e materialmente legitimado. (Ramella, Ob. cit., vol. II, nº 98). Daí decorre a responsabilidade do armazém geral pelas indicações expressas nos títulos. É o que atendeu o projeto com a disposição do art. 15, § 3º.
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Antes da emissão dos títulos, a mercadoria em depósito pode ser embargada ou penhorada pelos credores do depositante, pelo proprietário roubado, etc. Nessas condições, a empresa do armazém geral não deve, quando solicitada, entregar títulos representativos da mercadoria; se o fizer assumirá inteira responsabilidade para com o portador destes títulos, que, estando de boa-fé, não pudesse conseguir a livre disponibilidade da mercadoria.
Depois de emitidos os títulos, as mercadorias ficam afastadas de qualquer embaraço que prejudique a sua livre disposição. Esta espécie de imunidade ou asilo mercantil justifica-se, como bem diz o preclaro Vidari: " pela necessidade de animar o público a se servir de uma instituição que, enquanto, de um lado, garante eficazmente o direito de propriedade, de outro, garante, também eficazmente, os credores pignoratícios; proprietários e credores estarão certos de que, afora determinados casos, nenhum ato enfraquecerá os seus direitos". (Corso di Dir. Com., vol. IV, 4ª ed., nº 4.024).
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Para facilitar as operações comerciais, o projeto permite dividir a mercadoria em lotes e substituir os títulos primitivos por tantos outros quanto estes lotes. Para esse fim, porém, devem ser apresentados ao armazém geral esses dois títulos, para que a empresa saiba que o portador tem a livre disponibilidade da mercadoria e que sobre esta não pesa ônus algum.
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O projeto, seguindo exemplo da maior parte das leis estrangeiras, dá ao conhecimento de depósito e ao warrant o caráter de um título à ordem, e por conseguinte com a propriedade de ser transferido por endosso. O endosso faz circular efetivamente o título e simbolicamente a mercadoria, enquanto una et eadem traditone enumeratione, pluris obligationes toluntur uno momento.
O osso pode ser dos dois títulos unidos, ou de cada um deles, separadamente.
Também pode ele ser em branco, bastando que o endossador assine o nome no título. Quem quiser assumir os direitos do endossatário colocará o nome no espaço deixado em branco pelo endossador, como se o endosso desde o início tivesse sido feito à sua ordem.
Reconhece assim o projeto uma das formas de endosso já admitida no Código Comercial; o título em branco pode correr por muitas mãos antes de nele figurar o endossatário, e ser negociado como qualquer título ao portador, por meio de simples tradição manual. Desse modo ficam mais ou menos satisfeitos os que entendem que se deveria permitir a emissão daqueles títulos ao portador (coisa difícil e só admitida, aliás raramente, nos poucos países onde ainda vigora o regime do título único) para que mantenha secreto o seu nome quem fizer um empréstimo sobre mercadorias. (Vide Inglez de Souza, Títulos ao Portador, nº 444; Hecht, Die warrants, pág. 174)
Aquele que negocia o título com o endosso em branco, em regra, assim procede para transferi-lo a outrem, sem assumir responsabilidade; se sucessivas transferências são feitas sem que do título constem, a data, que aquele que endossou em branco pusesse no título, não indicaria o momento da chegada do título às mãos do que afinal enche o endosso.
Entretanto, o primeiro endosso do warrant, que dá vida autônoma a este título, deve enunciar a importância da dívida garantida, os juros (esta declaração do juro é aconselhada prevendo o caso do pagamento antecipado da dívida pelo portador do conhecimento de depósito) e data do vencimento. Não há necessidade da declaração de valor recebido ou em conta, como se exige no endosso das letras de câmbio.
O projeto dispensa no warrant o nome do primeiro endossatário, o credor. A indicação do nome do credor não tem utilidade alguma para o título, não restringe nem dificulta os direitos do portador do conhecimento do depósito e traz o inconveniente de denunciar aos sucessivos possuidores que quem emprestou sobre mercadorias necessitou, por sua vez, de dinheiro. Adota o projeto o sistema italiano e belga, e afasta-se do húngaro, russo, austríaco, francês e finlandês.
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O decreto nº 2.502, seguindo o sistema francês, impunha a formalidade do registro ou transcrição do primeiro endosso do warrant no conhecimento de depósito e no livro de talão, sendo assinada essa transcrição pelo endossatário.
O projeto dispensa aquela transcrição no livro do talão ou em outro criado para esse registro; contenta-se com a declaração do crédito garantido, sem juros e data do vencimento, no conhecimento de depósito, sendo assinada essa declaração pelo endossatário. A cargo deste fica cumprir no seu interesse, esta formalidade, que completa o seu direito de penhor, tornando-o oposto a terceiros.
É o sistema belga (lei de 1862, art. 6º), italiano (Código Comercial, art. 466) e português (Código Comercial, art. 412).
A transcrição no registro do armazém geral é inútil e causa embaraços e delongas. Com a declaração do primeiro endosso no conhecimento de depósito fica patente a existência do penhor, tanto para o que pretender a mercadoria, como para o armazém, quando aquele título lha for apresentado para a entrega da mercadoria. O primeiro não pagará a parte do preço correspondente à importância garantida pelo penhor; o segundo não entregará a mercadoria sem o pagamento do crédito garantido.
Tem-se procurado justificar a necessidade dessa transcrição nos livros do armazém geral, alegando maior confiança conferida ao título, excluindo a possibilidade de fraude com a alteração nas palavras de declaração inserta no conhecimento de depósito, e autenticando a data em que é constituído o penhor.
Tudo isso tem um alcance limitado, e pode substancialmente suceder com a cambial; entretanto, como observa Vidari, nem por isso a lei julgou oportuno estabelecer disposições especiais e embaraçar com exigências a pronta negociação deste título, bastando as disposições do Código Penal (I Magas. Generali, nº 128).
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A dívida deve ser paga no dia do vencimento ao portador do warrant contra a restituição deste.
Entretanto, o projeto, seguindo o que neste assunto está adotado, autoriza o pagamento voluntário antes do vencimento.
Para evitar prejuízos, com os que poderiam produzir uma próxima baixa do valor atual da mercadoria, as avarias e deteriorações, é conferida ao portador do conhecimento de depósito a excepcional faculdade de retirar a mercadoria antes do vencimento da dívida, consignando no armazém geral a sua importância com os juros até o vencimento. Simplificou-se o mais possível este processo, evitando a intervenção judicial e a solenidade da oferta prévia.
Esta consignação tem o efeito de real pagamento, e daí os dois corolários seguintes:
1º - quem faz a consignação fica inteiramente liberto, subsistindo somente a responsabilidade da empresa do armazém geral.
2º - o credor pode receber a quantia consignada antes mesmo do vencimento da sua dívida (Navarrini, ob. cit., nº 133).
Se até oito dias depois do vencimento da dívida o warrant não foi apresentado ao armazém geral, a empresa depositará judicialmente a importância da dívida e juros. Medida de cautela essa, e que coloca a empresa no seu devido papel.
As consignações e o depósito judicial serão anotados no livro de entrada e saída.
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No dia do vencimento do warrant o seu portador deve exigir o pagamento do primeiro endossador, que é o devedor principal; e satisfeito, deve-lhe restituir o título com a quitação.
Entrando o primeiro endossador na posse do warrant, e possuindo também o conhecimento do depósito, reassume o direito de plena disponibilidade da mercadoria, extinguindo-se todas as relações decorrentes do contrato de penhor. Pode, porém, suceder que aquele primeiro endossador negociasse o conhecimento de depósito, achando-se este em mãos de terceiro. Sobre esta situação falaremos mais adiante.
Se o primeiro devedor não paga, e se no armazém geral não foi consignada a importância da dívida e juros, o projeto concede ao credor um tratamento jurídico pronto e seguro.
O primeiro ato deste processo especial é a interposição do protesto, tal como se fosse uma letra de câmbio.
O agente de venda, tendo a autorização do portador do warrant dará aviso ao administrador do armazém, para que seja facultado o exame da mercadoria aos interessados, e no dia anunciado, apresentando-se com o título e o protesto, efetuará a venda, e prestará contas ao armazém geral, na forma indicada no art. 24 do projeto.
A venda será anunciada durante 4 dias. Far-se-á sem formalidade jurídica. Exceção esta ao direito comum, tendo por fim uma execução rápida em seus efeitos.
O armazém geral recebe o preço da venda e em seguida entrega a mercadoria ao comprador. Imediatamente passará ele a verificar e a graduar os créditos preferenciais, e com o líquido pagará a dívida do warrant. Esta tarefa importante, que é confiada ao armazém geral, deve ser desempenhada com a máxima diligência, não podendo este retardar o pagamento do credor por mais tempo do que o estritamente necessário para o respectivo cálculo.
Pelo produto da venda pagam-se: em primeiro lugar, a Fazenda Nacional, dos seus direitos de consumo ou impostos de importação, se se trata de mercadorias estrangeiras a eles sujeitas; em segundo lugar, o corretor ou leiloeiro, de sua comissão e das despesas feitas com anúncios, publicações, catálogos, etc.; em terceiro lugar, o armazém geral, das despesas declaradas no art. 26 §1º, nº 3, do projeto, a respeito das quais lhe é garantido o direito de retenção.
Todos estes créditos preferenciais devem constar dos títulos, se na época da emissão forem certos e líquidos será mencionada a importância exata; se não, como despesas de armazenagens e de conservação, etc.; apenas se declararão a sua natureza e o armazém geral é obrigado a dar todas as vezes que lhe for solicitado pelo portador de qualquer dos títulos, a nota da liquidação destes créditos até o dia do pedido.
Sobre o excedente, depois de deduzidos os créditos preferenciais acima referidos, tem o portador do warrant privilégio e preferência sobre todos os demais credores do dono da mercadoria. Este privilégio é do credor pignoratício; o portador do warrant exercita um direito de retenção por intermédio do armazém geral.
Sendo integralmente pago, o credor deixa o warrant no armazém geral com a quitação; se não é pago integralmente, este fará no título a declaração do pagamento parcial e o restituirá ao portador.
Abre-se, então, a ação regressiva contra os endossadores, solidariamente obrigados ao pagamento da dívida do warrant, e, no caso, ao pagamento do saldo.
O exercício deste direito do portador do warrant é, pois, subsidiário; depende do prévio exercício do direito de venda da mercadoria onerada do penhor. Assim, os responsáveis pessoalmente pela dívida não ficarão expostos ao capricho do credor. O próprio devedor principal não sofrerá execução sobre seus bens, sem que seja realizada a venda da mercadoria.
A lei procurou criar, diz Aldrick Cammont, não o crédito pessoal que já temos por meio das letras de obrigações, mas o crédito sobre mercadoria, a qual, graças ao warrant, se converte em um valor ativo e circulante. A restrição imposta ao mutuante de proceder contra o mutuário e os endossadores somente depois de exercer os seus direitos sobre a mercadoria e no caso de insuficiência do produto da venda, é um benefício da lei, pondera judiciosamente o mesmo distinto advogado; o mutuante deve adiantar sobre a mercadoria quantia que fique ao abrigo das eventualidades, e é justo que o mutuário, que perde a disposição da sua mercadoria, quando a oferece em garantia, alivie proporcionalmente o seu débito. (Instit. Du Crédit sur marchandises, nº 137).
O prazo para o exercício da ação regressiva é contado do dia da venda da mercadoria, porque só então fica verificada a insuficiência do preço para o pagamento integral do credor.
A fim de evitar que o portador prolongue o exercício dessa ação regressiva, demorando a venda das mercadorias, o projeto faz prescrever aquela ação nos casos em que o protesto não tenha sido interposto em tempo hábil, e a venda não seja realizada dentro de dez dias.
Suponhamos agora que o primeiro endossador do warrant, o devedor, tenha negociado o conhecimento de depósito e por isso se ache este em mãos de terceiro. Este terceiro não paga a importância da dívida: o primeiro endossador do warrant, que embolsa o portador atual, para evitar o protesto, fica subrogado nos direitos deste último. Não há necessidade de constituir em mora o portador do conhecimento de depósito muitas vezes desconhecido, e que deve saber o dia do vencimento da dívida do warrant, em virtude da declaração transcrita naquele título em seu poder.
Para o caso de falência basta somente estabelecer que a superveniência dela não suspenda a venda da mercadoria oferecida em garantia da dívida.
Quanto às invalidades, consequência da falência, é conveniente deixar os títulos sujeitos ao direito comum. Nada de exceções, que poderiam, sob a capa de beneficiarem a instituição, ser o valhacouto da fraude.
O conhecimento de depósito prova tão-somente a existência da mercadoria no armazém geral à disposição do seu portador, ressalvados os direitos do portador do warrant. Se, pois, para o pagamento de dívida não vencida é endossado o conhecimento de depósito dentro do termo legal da falência, claro é que se dá no caso uma verdadeira dação em pagamento incidindo na invalidade de pleno direito determinada no art. 29, "b", do decreto nº 917, de 24 de outubro de 1890.
O mesmo se dirá quando forem endossados simultaneamente os dois títulos.
Quando dentro do termo legal da falência, o só warrant é endossado para garantir dívida contraída anteriormente aquele termo, incidirá o endosso na invalidade de pleno direito estabelecida pelo art. 29, "c", do citado decreto nº 917.
Outrossim, a tranferência destes títulos será sempre anulável a benefício da massa, quando se der a fraude pauliana (art. 30, "b", do citado decreto nº 917).
O principal, a atender nesse assunto, é o direito de terceiros de boa-fé. Estes estão garantidos com a disposição do art. 32, do citado decreto nº 917).
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Para os casos de perda, roubo, furto, extravio ou destruição dos dois títulos e de cada um, quando destacados e separadamente negociados, o projeto estabelece a disposição do art. 27.
O sistema aí seguido é novo e pareceu-nos ser aquele que melhor resguarda os interesses em jogo.
O decreto nº 2.502, art. 9º, manda fornecer duplicata tanto do conhecimento de depósito como do warrant e autoriza a entrega ou venda da coisa depositada três dias depois de anunciada a perda nos jornais de maior circulação e por editais afixados na praça do comércio ou lugares mais públicos, não tendo comparecido alguém a reclamar o seu direito.
Não exigiu aquele decreto a prévia justificação da propriedade do título perdido e nem tomou as cautelas necessárias para repelir a fraude.
As leis estrangeiras seguem neste assunto diversos sistemas, cada qual o seu, sendo que as leis austríaca e húngara e o Código Federal Suíço das Obrigações aplicam aos títulos perdidos ou extraviados as mesmas disposições das letras de câmbio em idênticas circunstâncias. Não têm faltado acerbas críticas àqueles sistemas, mais ou menos fundadas.
Segundo o projeto, o portador que perder o conhecimento de depósito, ou este e o warrant correspondente, tem dois meios à sua escolha:
1º - pedir duplicata do título ou títulos;
2º - receber a mercadoria ou, se esta tiver sido vendida, ou retirada nos termos do art. 22, o saldo à sua disposição.
Se ele negociou o warrant, ou se recebeu só o conhecimento de depósito por endosso, tem de respeitar os direitos do portador do warrant.
O portador do warrant, porém, tem somente o direito de receber, não a duplicata do título, mas a importância do crédito garantido.
A lei francesa de 1858 assim também dispõe; entretanto, sob o fundamento de que o portador do warrant perdido ou extravio deve ser reintegrado na precisa condição jurídica em que se acharia caso não houvesse a perda ou extravio, a lei Bale, de 1864, art. 12; a lei belga de 1862, art. 24, § 10; o Código Comercial italiano, art. 476; a lei americana de 1856, § 3º, c. 392; a russa de 1888, art. 41, e a finlandesa de 1892, art. 31, permitem a duplicata do warrant.
Preferível é a legislação francesa, em nosso pensar. Não sabemos como possa ser útil a duplicata do warrant entregue pelo armazém geral. O que dá força e vida ao warrant é o primeiro endosso, onde são indicadas a importância e a época do vencimento da obrigação. A duplicata sem este endosso não teria valor, e nem permitiria ao portador negociá-lo com tranquilidade e confiança. Das letras de câmbio perdidas ou extraviadas não manda a lei dar duplicata; ao contrário, estabelece rigorosas disposições o art. 388 do Código Comercial, no intuito de evitar os abusos que causaria duplicata. Estes abusos e fraudes poderiam também sobrevir com as duplicatas dos warrants negociados.
Na Inglaterra, no caso de perda ou furto do warrant (único título que ali se emite), o proprietário avisa ao público por meio do public leger, o jornal do alto comércio. Sete dias depois desse aviso pode Ter lugar a entrega das mercadorias do anunciante. Os proprietários podiam outrora obter dos docks um novo warrant, observando as mesmas formalidades que para emissão do primitivo, mas informa-nos. Scansa, esta prática trouxe abusos e dificuldades . A Table of rates, charges and regulations for impost of the London and Indian dock joint committée, de 1º de janeiro de 1889, declara que em circunstância alguma será entregue duplicata do warrant. (Magazins genéraux, pág. 117).
O projeto exige intervenção da autoridade judicial, perante a qual deve ser provada a propriedade do título perdido ou extraviado e discutidas e resolvidas as reclamações que aparecem.
As empresas de armazéns gerais podem ter anexa aos seus estabelecimentos uma sala especialmente reservada para venda das mercadorias existentes em depósito.
As vendas públicas nos armazéns gerais não têm atualmente a importância que se afigura.
As vendas a prazo, as opções, o report, o depost, que alimentam as bolsas de comércio, estão levando de vencida as vendas públicas.
No "O Direito" vol. 81, págs. 29 e seguintes, fizemos algumas considerações sobre a instituição daquelas vendas, e por atacado.
Só fará vender publicamente a sua mercadoria aquele que nesta forma de venda achar vantagens. A venda obrigatória será somente no caso de excussão do warrant ou de abandono da mercadoria.
A lei nº 559, de 31-12-1898, taxa o valor mínimo do lote em 1:000$000. O projeto eleva a 2:000$000.
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O projeto determina o selo que devem pagar os títulos, e reproduz o que já existe disposto no regulamento do selo.
É indispensável evitar a morte da instituição, sufocada por impostos de que hoje tão facilmente se abusa. O art. 31 do projeto proíbe aos Estados e às municipalidades taxar os depósitos nos armazéns gerais, e as compras e vendas realizadas nas respectivas salas. Todo o empenho do poder público deve ser o de animar os depositantes, poupar-lhes despesas e incômodos. Desde que o depositante se veja sobrecarregado de impostos, por ter procurado os armazéns gerais e dispensado armazéns particulares, frustrado está o escopo da instituição; é preferível não a fomentar nem promover o seu progresso.
Talvez se devesse ir mais adiante. Como se trata de uma instituição nova entre nós, seria muito justo e conveniente que se isentasse as empresas de armazéns gerais, que já não tem isenção, de quaisquer impostos estaduais e municipais durante cinco anos.
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O projeto estabelece finalmente penalidades para os abusos e infrações das leis e regulamentos por parte das empresas de armazéns gerais, e traz outras disposições que completam o seu sistema.
A leitura dos capítulos IV e V dará idéia completa das medidas aí providenciadas.
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As imperfeições deste trabalho, que não são poucas, encontrarão escusa na dificuldade do assunto e na falta de ensinamentos práticos. A experiência é que nos dará as precisas lições para a emenda e correção do que, no momento, parece satisfazer.
Santos, junho de 1901
J.X. Carvalho de Mendonça
Decreto nº 1102, de 21 de Novembro de 1903
" O Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil:
"Faço saber que o Congresso Nacional decretou e eu sanciono a seguinte resolução:
Dos armazéns gerais
CAPÍTULO I
Estabelecimento, obrigações e direitos das empresas de armazéns gerais
Art. 1º - As pessoas naturais ou jurídicas, aptas para o exercício do comércio, que pretenderem estabelecer empresas de armazéns gerais, tendo por fim a guarda e conservação de mercadorias e a emissão de títulos especiais, que as representem, deverão declarar à Junta Comercial do respectivo distrito:
1º, a sua firma, ou, se se tratar de sociedade anônima, a designação que lhe for própria, o capital da empresa e o domicílio;
2º, a denominação, a situação, o número, a capacidade, a comunidade e a segurança dos armazéns;
3º, a natureza das mercadorias que recebem em depósito;
4º, as operações e serviços a que se propõem.
A essas declarações juntarão:
a) o regulamento interno dos armazéns e da sala de vendas públicas;
b) a tarifa remuneratória do depósito e dos outros serviços;
c) a certidão do contrato social ou estatutos, devidamente registrados, se se tratar de pessoa jurídica.
§ 1º - A Junta Comercial, verificando que o regulamento interno não infringe os preceitos da presente lei, ordenará a matrícula do pretendente no registro do comércio e, dentro do prazo de um mês contado do dia desta matrícula fará publicar, por edital, as declarações, o regulamento interno e a tarifa.
§ 2º - Arquivado na secretaria da JUNTA COMERCIAL um exemplar das folhas em que se fizer a publicação, o empresário assinará termo de responsabilidade, como fiel depositário dos gêneros e mercadorias que receber, e só depois de preenchida esta formalidade, que se fará conhecida de terceiros por novo edital da Junta, poderão ser iniciados os serviços e operações que constituem objeto da empresa.
§ 3º - As alterações ao regimento interno e à tarifa entrarão em vigor trinta dias depois da publicação, por edital, da Junta Comercial, e não se aplicarão aos depósitos realizados até a véspera do dia em que elas entrarem em vigor, salvo se trouxerem vantagens ou benefícios aos depositantes.
§ 4º - Os administradores dos armazéns gerais , quando não forem os próprios empresários, os fiéis e outros prepostos, antes de entrarem em exercício, receberão do proponente uma nomeação escrita que farão inscrever no registro do comércio. (Código Comercial, arts. 74 e 10 nº 2).
§ 5º - Não poderão ser empresários, administradores ou fiéis de armazéns gerais os que tiverem sofrido condenação pelos crimes de falência culposa ou fraudulenta, estelionato, abuso de confiança, falsidade, roubo ou furto.
§ 6º - As publicações a que se referem este artigo devem ser feitas no Diário Oficial da União ou do Estado e no jornal de maior circulação da sede dos armazéns gerais e à custa do interessado.
Art. 2º - O Governo Federal designará as alfândegas que estiverem em condições de emitir os títulos de que trata o capítulo II, sobre mercadorias recolhidas em seus armazéns, e, por decreto expedido pelo Ministro da Fazenda , dará as instruções sobre o respectivo serviço e a tarifa.
Parágrafo único - Os títulos emanados destas repartições serão em tudo equiparados aos que as empresas particulares emitirem, e as mercadorias por eles representadas ficarão sob o regime da presente lei.
Art. 3º - Nas estações de estrada de ferro da União poderá o Governo, por intermédio do Ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas, estabelecer armazéns gerais , expedindo as necessárias instruções e a tarifa, sendo aplicada, às mercadorias em depósito e aos títulos emitidos , a disposição do § único do art. 2º.
Parágrafo único - As companhias ou empresas particulares de Estradas de Ferro ficarão sujeitas às disposições do art. 1º se quiserem emitir os títulos de suas estações, devendo apresentar, com as declarações a que se refere aquele artigo, autorização especial do Governo que lhes fez a concessão.
Art. 4º - As empresas ou companhias de docas que recebem em seus armazéns mercadorias de importação e exportação (Decreto Legislativo nº 1.746, de 13 de outubro de 1869, art. 1º) e os concessionários de entrepostos e trapiches alfandegados poderão solicitar do Governo Federal autorização para emitirem sobre mercadorias em depósito os títulos de que trata o capítulo II, declarando as garantias que oferecem à Fazenda Nacional e apresentando o regulamento interno dos armazéns e a tarifa remuneratória do depósito e de outro serviço a que se proponham.
Nestes regulamentos serão estabelecidas as relações das companhias das docas e concessionários de entrepostos e trapiches alfandegários com os empregados aduaneiros .
Autorização para emissão dos títulos e a aprovação do regulamento e tarifa serão dadas por decreto expedido pelo Ministério da Fazenda.
Nenhuma alteração será feita ao regulamento ou à tarifa, sem as mesmas formalidades, prevalecendo a disposição da segunda parte do §3º do art. 1º.
Parágrafo único - Obtida a autorização , as docas, os entrepostos particulares e os trapiches alfandegados ficarão sujeitos às disposições da presente lei , adquirindo a qualidade de armazéns gerais.
Art. 5º - Na porta principal dos entrepostos públicos ou armazéns das alfândegas e das estações de estrada de ferro da União (arts. 2º e 3º), na dos estabelecimentos mantidos e custeados por empresas particulares (arts. 1º e 4º) e nas salas de vendas públicas (art. 28) serão afixados , em lugar visível, as instruções oficiais ou o regulamento interno e a tarifa e exemplares impressos destas peças serão entregues, gratuitamente , aos interessados que os solicitarem .
Art. 6º - Das mercadorias confiadas à sua guarda, os armazéns gerais passarão recibo declarando nele a natureza, quantidade, número e marcas, fazendo pesar, medir ou contar, no ato do recebimento as que forem suscetíveis de ser pesadas, medidas ou contadas.
No verso deste recibo serão anotadas pelo armazém geral as retiradas parciais das mercadorias, durante o depósito.
Esta disposição não se aplica às mercadorias estrangeiras sujeitas a direitos de importação, a respeito das quais se observarão os regulamentos fiscais.
Parágrafo único - O recibo será restituído ao armazém geral contra a entrega das mercadorias ou dos títulos do art. 15, a pedido do dono, forem emitidos. A quem tiver o direito de livre disposição das mercadorias é facultado, durante o prazo do depósito (art. 10), substituir esses títulos por aquele recibo.
Art. 7º - Além dos livros mencionados no art. 11 do Código Comercial, as empresas de armazéns gerais são obrigadas a ter, revestidos das formalidades do art. 13 do mesmo Código, e escriturado rigorosamente dia a dia , um livro de entrada e saída de mercadorias, devendo os lançamentos ser feitos na forma do art. 88, nº 11, do citado Código, sendo anotadas as consignações em pagamento (art. 12), as vendas e todas as circunstâncias que ocorrem relativamente às mercadorias depositadas.
As docas, entrepostos particulares e trapiches alfandegados lançarão naquele livro as mercadorias estrangeiras sujeitas a direitos de importação sobre os quais, o pedido do dono, tenham de emitir os títulos do art. 15.
O Governo, nas instruções que expedir para as alfândegas e armazéns de estrada de ferro da União, determinará os livros destinados ao serviço do registro das mercadorias sobre as quais forem emitidos os títulos do art. 15 e seus requisitos de autenticidade.
Art. 8º - Não podem os armazéns gerais:
§1º - Estabelecer preferência entre os depositantes a respeito de qualquer serviço.
§2º - Recusar o depósito, exceto:
- se a mercadoria que se deseja armazenar não for tolerada pelo regulamento interno;
- se não houver espaço para a sua acomodação;
- se, em virtude das condições em que ela se achar, puder danificar as já depositadas.
§3º - Abater o preço marcado na tarifa em benefício de qualquer depositante.
§4º - Exercer o comércio de mercadorias idênticas às que se propõem receber em depósito, e adquirir, para si ou para outrem, mercadorias expostas à venda em seus estabelecimentos, ainda que seja a pretexto de consumo particular.
§5º - Emprestar ou fazer, por conta própria ou alheia, qualquer negociação sobre os títulos que emitirem.
Art. 9º - Serão permitidos aos interessados o exame e a verificação das mercadorias depositadas e a conferência das amostras, podendo, no regulamento interno do armazém, ser indicadas as horas para esse fim e tomadas as cautelas convenientes.
§único - As mercadorias de que trata o art. 12 serão examinadas pelas amostras que deverão ser expostas no armazém.
Art. 10 - O prazo de depósito, para os efeitos deste artigo, começará a correr da data da entrada da mercadoria nos armazéns gerais e será de seis meses, podendo ser prorrogado livremente por acordo das partes.
Para as mercadorias estrangeiras sujeitas a direitos de importação e sobre as quais tenham sido emitidos os títulos do art. 15, o prazo de seis meses poderá ser prorrogado até mais um ano pelo inspetor da Alfândega, se o estado das mercadorias garantir o pagamento integral daqueles direitos, armazenagens e as despesas e adiantamentos referidos no art. 14.
Se estas mercadorias estiverem depositadas nas docas, nos entrepostos particulares e nos trapiches alfandegados, a prorrogação do prazo dependerá também do consentimento da respectiva companhia ou concessionário.
§1º - Vencido o prazo do depósito, a mercadoria reputar-se-á abandonada e o armazém geral dará aviso ao depositante, marcando-lhe o prazo de oito dias improrrogáveis, para a retirada da mercadoria contra a entrega do recibo (art. 6º) ou dos títulos emitidos (art. 15).
Findo este prazo, que correrá do dia em que o aviso for registrado no correio, o armazém geral mandará vender a mercadoria por corretor ou leiloeiro, em leilão público, anunciado com antecedência de três dias pelo menos, observando-se as disposições do art. 28, §§ 3º, 4º, 6º e 7º.
§ 2º - Para prova do aviso prévio bastarão a sua transcrição no copiador do armazém geral e o certificado do registro da expedição pelo correio.
§ 3º - O produto da venda, deduzidos os créditos indicados no art. 26 § 1º, se não for procurado, por quem de direito , dentro do prazo de oito dias, será depositado judicialmente por conta de quem pertencer.
As alfândegas reterão em seus cofres esse saldo e a administração da estrada de ferro da União o recolherá à repartição fiscal designada pelo Governo nas instruções expedidas na conformidade do art. 3º.
§ 4º - Não obstante o processo do art. 27, §§ 2º e 3º, verificado o caso do § 1º do presente artigo, o armazém geral ou a competente repartição federal fará vender a mercadoria, certificando com antecedência de cinco dias ao juiz daquele processo.
Deduzidos do produto da venda os créditos indicados no art. 26, § 1º, o líquido será posto à disposição do juiz.
É permitido ao que perder o título obstar a venda, ficando prorrogado o depósito por mais três meses, se pagar os impostos fiscais e as despesas declaradas no art. 23, § 6º.
Art. 11º - As empresas de armazéns gerais, além das responsabilidades especialmente estabelecidas nesta lei, respondem:
1º - pela guarda, conservação e pronta e fiel entrega das mercadorias que tiverem recebido em depósito, sob pena de serem presos os empresários, gerentes, superintendentes ou administradores sempre que não efetuarem aquela entrega dentro de 24 horas depois que judicialmente forem requeridos;
Cessa a responsabilidade nos casos de avarias ou vícios provenientes da natureza ou acondicionamento das mercadorias, e força maior, salvo a disposição do art. 37, § único;
2º - pela culpa, fraude ou dolo de seus empregados e prepostos e pelos furtos acontecidos aos gêneros e mercadorias dentro dos armazéns.
§ 1º - A indenização devida pelos armazéns gerais nos casos referidos neste artigo, será correspondente ao preço da mercadoria e em bom estado no lugar e no tempo em que devia ser entregue.
O direito à indenização prescreve em três meses, contados do dia em que a mercadoria foi ou devia ser entregue.
§ 2º - Pelas alfândegas e estradas de ferro da União responde, diretamente, a Fazenda Nacional, com ação regressiva contra seus funcionários culpados.
Art. 12 - Nos armazéns gerais podem ser recebidas mercadorias da mesma natureza e qualidade, pertencentes a diversos donos, guardando-se misturadas.
Para este gênero de depósito deverão os armazéns gerais dispor de lugares próprios e se aparelhar para o bom desempenho do serviço.
As declarações de que trata o art. 1º juntará o empresário a descrição minuciosa de todos os aprestos do armazém, e a matrícula no registro do comércio somente será feita depois de exame mandado proceder pela Junta Comercial, por profissionais e à custa do interessado.
§ 1º - Neste depósito, além das disposições especiais na presente lei, observar-se-ão as seguintes:
1º - o armazém geral não é obrigado a restituir a própria mercadoria recebida, mas pode entregar mercadorias da mesma qualidade;
2º - o armazém geral responde pelas perdas e avarias da mercadoria, ainda mesmo no caso de força maior.
§ 2º - Relativamente às docas, entrepostos particulares e trapiches alfandegados, a atribuição acima conferida à Junta Comercial cabe ao Governo Federal.
Art. 13 - Os armazéns gerais ficam sob a imediata fiscalização das Juntas Comerciais, às quais os empresários remeterão até o dia 15 dos meses de abril, julho, outubro e janeiro de cada ano um balanço, em resumo, das mercadorias que, no trimestre anterior, tiverem entrado e saído e das que existirem, bem como a demonstração do movimento dos títulos que emitirem, a importância dos valores com que os mesmos títulos forem negociados, as quantias consignadas na conformidade do art. 22, e o movimento das vendas públicas, onde existir a sala de que trata o capítulo III.
Até o dia 15 de março, as empresas apresentarão o balanço detalhado de todas as operações e serviços realizados, durante o ano anterior, nos armazéns gerais e salas de vendas públicas fazendo acompanhar de um relatório circunstanciado contendo as considerações que julgarem úteis.
§ 1º - As alfândegas, docas, entrepostos particulares e trapiches alfandegados ficarão, porém, sob a exclusiva fiscalização do Ministério da Fazenda e os armazéns da estação de estradas de ferro da União sob o do Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas.
Os inspetores das alfândegas, empresas ou companhias de docas, concessionários de entrepostos e trapiches alfandegados e diretores de estrada de ferro federais enviarão nas épocas acima designadas os balanços trimestrais e o balanço e o relatório anuais ao respectivo ministério.
§ 2º - O Ministério da Fazenda, o da Indústria, Viação e Obras Públicas e as Juntas Comerciais poderão, sempre que acharem conveniente, mandar inspecionar os armazéns sob fiscalização, a fim de verificarem se os balanços apresentados estão anexos ou se têm fielmente cumpridas as instruções, o regulamento interno e a tarifa.
Art. 14 - As empresas de armazéns gerais têm o direito de retenção para garantia do pagamento das armazenagens e despesas com a conservação e com as operações, benefícios e serviços prestados às mercadorias, a pedido do dono; dos adiantamentos feitos com fretes e seguro, e das comissões e juros, quando as mercadorias lhes tenham sido remetidas em consignação. (Código Comercial, art. 189)
Esse direito de retenção pode ser oposto à massa falida do devedor.
Também têm as empresas de armazéns gerais direitos de indenização pelos prejuízos que lhes venham por culpa ou dolo do depositante.
CAPÍTULO II
Emissão, circulação dos títulos emitidos pelas empresas de armazéns gerais
Art. 15 - Os armazéns gerais emitirão, quando lhes for pedido pelo depositante, dois títulos unidos, mas separáveis à vontade, denominados - "conhecimento de depósito" e "warrant".
§ 1º - Cada um destes títulos deve ser à ordem e conter, além de sua designação particular;
1º - a denominação da empresa do armazém geral e sua sede;
2º - o nome, profissão e domicílio do depositante ou de terceiro por este indicado;
3º - o lugar e prazo de depósito;
4º - a natureza e quantidade das mercadorias em depósito, designados pelos nomes mais usados no comércio, seu peso, o estado dos envoltórios e todas as marcas e indicações próprias para estabelecerem a sua identidade;
5º - a qualidade da mercadoria tratando-se daquelas a que se refere o art. 12;
6º - a indicação do segurador da mercadoria e o valor do seguro (art. 16).
7º - a declaração dos impostos e direitos fiscais, dos encargos e despesas a que a mercadoria está sujeita, e do dia em que começaram a correr as armazenagens (art. 26, § 2º);
8º - a data da emissão dos títulos e assinatura do empresário ou pessoa devidamente habilitada por este.
§ 2º - Os referidos serão extraídos de um livro de talão, o qual conterá todas as declarações acima mencionadas, e número de ordem correspondente.
No verso do respectivo talão, o depositante, ou terceiro, por este autorizado, passará recibo dos títulos. Se a empresa, a pedido do depositante, os expedir pelo correio, mencionará esta circunstância e o número e data do certificado do registro postal.
Anotar-se-ão também no verso do talão as ocorrências que se derem com os títulos dele extraídos, como substituição, restituição, perda, roubo, etc.
§ 3º - Os armazéns gerais são responsáveis para com terceiros pelas irregularidades e inexatidões encontradas nos títulos que emitirem relativamente à quantidade, natureza e peso da mercadoria.
Art. 16 - As mercadorias, para servirem de base à emissão dos títulos, devem ser seguradas contra riscos de incêndio do valor designado pelo depositante.
Os armazéns gerais poderão ter apólices especiais ou abertas para este fim.
No caso de sinistro, o armazém geral é o competente para receber a indenização devida pelo segurador, e sobre esta exercerão a Fazenda Nacional, a empresa de armazéns gerais e os portadores de conhecimentos de depósito e "warrant" os mesmos direitos e privilégios que tenham sobre a mercadoria segurado.
§ único - As mercadorias de que trata o art. 12 serão seguradas em nome da empresa do armazém geral, a qual fica responsável pela indenização no caso de sinistro.
Art. 17 - Emitidos os títulos de que trata o art. 15, os gêneros e mercadorias não poderão sofrer embaraço que prejudique a sua livre e plena disposição, salvo nos casos do art. 27.
O conhecimento de depósito e o "warrant", ao contrário, podem ser penhorados, arrestados por dívidas do portador.
Art. 18 - O conhecimento do depósito e o "warrant" podem ser transferidos, unidos ou separados, por endosso.
§ 1º - O endosso podem ser em branco; neste caso confere ao portador do título os direitos de cessionário.
§ 2º - O endosso dos títulos unidos confere ao cessionário o direito de livre disposição da mercadoria depositada; o do "warrant" separado do conhecimento de depósito o direito de penhor sobre a mesma mercadoria e do conhecimento de depósito a faculdade de dispor da mercadoria, salvo os direitos do credor, portador do "warrant".
Art. 19 - O primeiro endosso do "warrant" declarará a importância do crédito garantido pelo penhor da mercadoria, taxa do juros e a data do vencimento.
Essas declarações serão transcritas no conhecimento de depósito e assinados pelos endossatários do "warrant".
Art. 20 - O portador dos dois títulos tem o direito de pedir a divisão da mercadoria em tantos lotes quantos lhe convenham, e entrega de conhecimentos de depósito de "warrants" correspondentes a cada um dos lotes, sendo restituídos, e ficando anulados os títulos anteriormente emitidos.
Esta divisão somente será facultada se a mercadoria continuar a garantir os créditos preferenciais do art. 26, § 1º.
§ único - Outrossim, é permitido ao portador dos dois títulos pedir novos títulos à sua ordem ou de terceiro que indicar, em substituição dos primitivos, que serão restituídos ao armazém geral e anulados.
Art. 21 - A mercadoria depositada será retirada do armazém geral contra a entrega do conhecimento de depósito ou do "warrant" correspondente, liberta pelo pagamento principal e juros da dívida, se foi negociado.
Art. 22 - Ao portador do conhecimento de depósito é permitido retirar a mercadoria antes do vencimento da dívida constante do "warrant", consignando o armazém geral o principal e juros até o vencimento e pagando os impostos fiscais, armazenagens vencidas e mais despesas.
Da quantia consignada o armazém geral passará recibo, extraído de um livro de talão.
§ 1º - O armazém geral dará por carta registrada imediato aviso desta consignação ao primeiro endossador do "warrant".
Este aviso quando contestado será provado nos termos do art. 10, § 2º.
§ 2º - A consignação equivale a real e efetivo pagamento e a quantia consignada será prontamente entregue ao credor mediante a restituição do "warrant" com a devida quitação.
§ 3º - Se o "warrant" não for apresentado ao armazém geral até oito dias depois do vencimento da dívida, a quantia consignada será levada a depósito judicial por conta de quem pertencer.
Nas alfândegas estradas federais, essa quantia terá o destino declarado no art. 10, § 3º, "in fine".
§ 4º - A perda, o roubo, o extravio do "warrant" não prejudicarão o exercício do direito que este artigo confere ao portador do conhecimento de depósito.
Art. 23 - O portador do "warrant" que no dia do vencimento não for pago, e que não achar consignada no armazém geral a importância do seu crédito e juros (art. 22), deverá interpor o respectivo protesto nos prazos e pela forma aplicáveis ao protesto das letras de câmbio no caso de não pagamento.
O oficial dos protestos entregará ao protestante o respectivo instrumento, dentro do prazo de três dias, sob pena de responsabilidade e de satisfazer perdas e danos.
§ 1º - O portador do "warrant" fará vender em leilão, por intermédio do corretor ou leiloeiro, que escolher, as mercadorias especificadas no título, independentes de formalidades judiciais.
§ 2º - Igual direito de venda cabe ao primeiro endossador que pagar a dívida do "warrant", sem que seja necessário constituir em mora os endossadores do conhecimento do depósito.
§ 3º - O corretor ou leiloeiro, encarregado da venda depois de avisar o administrador do armazém geral, ou o chefe da competente repartição federal, anunciará pela imprensa o leilão, com antecedência de quatro dias, especificando as mercadorias conforme as declarações do "warrant" e declarando o dia e hora da venda, as condições dessa e o lugar onde podem ser examinadas aquelas mercadorias.
O agente da venda conformar-se-á em tudo com as disposições do regulamento interno dos armazéns e das salas de vendas públicas ou com as instruções oficiais, tratando-se de repartição federal.
§ 4º - Se o arrematante não pagar o preço da venda, aplicar-se-á a disposição do art. 28, § 6º
§5º - A perda ou extravio do conhecimento de depósito (art. 27, § 1º), a falência, os meios preventivos de sua declaração e a morte do devedor não suspendem nem interrompem a venda anunciada.
§ 6º - O devedor poderá evitar a venda até o momento de ser a mercadoria adjudicada ao que maior lance oferecer, pagando imediatamente a dívida de "warrant", os impostos fiscais, despesas devidas ao armazém e todos os mais a que a execução deu lugar, inclusive custas do protesto, comissões do corretor ou agentes de leilões e juros de mora.
§ 7º - O portador do "warrant" que, em tempo útil, não interpuser o protesto por falta de pagamento, ou que, dentro de dez dias, contados da data do instrumento de protesto, não promover a venda da mercadoria, conservará tão-somente ação contra o primeiro endossador do "warrant" e contra os endossadores do conhecimento de depósito.
Art. 24 - Efetuada a venda, o corretor ou leiloeiro dará a nota do contrato ou conta de venda ao armazém geral, o qual receberá o preço e entregará ao comprador a mercadoria.
§ 1º - O armazém geral, imediatamente após o recebimento do produto da venda, fará deduções de créditos preferenciais, art. 26, § 1º, e com o líquido pagará o portador do "warrant" nos termos do art. 26, princípio.
§ 2º - O portador do "warrant" que ficar integralmente pago entregará, ao armazém geral, o título com a quitação; no caso contrário, o armazém geral mencionará no "warrant" o pagamento parcial feito e o restituirá ao portador.
§ 3º - Pago o credor, o excedente do preço da venda será entregue ao portador do conhecimento de depósito contra a restituição deste título.
§ 4º - As quantias reservadas ao portador do "warrant" ou ao do conhecimento de depósito, quando não reclamados no prazo de trinta dias depois da venda da mercadoria, terão o destino declarado no art. 10, § 3º .
Art. 25 - Se o portador do "warrant" não ficar integralmente pago, em virtude da insuficiência do produto líquido da venda da mercadoria ou da indenização do seguro no caso de sinistro tem ação para haver o saldo contra os endossadores anteriores solidariamente, observando-se a esse respeito as mesmas disposições substanciais e processuais (de fundo e de forma) relativo a letras de câmbio.
O prazo para prescrição de ação regressiva corre do dia da venda.
Art. 26 - O portador do "warrant" será pago do seu crédito, juros convencionais e demora à razão de 6% ao ano e despesas do protesto, precipuamente pelo produto da venda da mercadoria.
§ 1º - Preferem, porém, a este credor:
1º - a Fazenda Nacional, pelos direitos ou impostos que lhe forem devidos;
2º - o corretor ou leiloeiro, pelas comissões taxadas em seus regimentos ou reguladas por convenção entre eles e os comitentes, e pelas despesas com anúncio da venda;
3º - o armazém geral, por todas as despesas declaradas no art. 14, a respeito das quais lhe é garantido o direito de retenção.
§ 2º - Os créditos do § 1º, números 1 e 3, devem ser expressamente referidos nos títulos (art. 15, § 1º, n. 7), declarando-se a quantia exata dos impostos devidos à Fazenda Nacional e de todas as despesas líquidas até o momento da emissão daqueles títulos, pena de perda da preferência.
Todas as vezes que lhe for exigido pelo portador de conhecimento de depósito ou do "warrant", o armazém geral é obrigado a liquidar os créditos que preferem no "warrant" e fornecer a nota da liquidação, datada e assinada, referindo-se ao emitido.
Art. 27 - Aquele que perder o título avisará ao armazém geral e anunciará o fato durante três dias, pelo jornal de maior circulação da sede daquele armazém.
§ 1º - Se se tratar do conhecimento de depósito e correspondente "warrant", ou só do primeiro, o interessado poderá obter duplicata ou a entrega das mercadorias, garantindo o direito do portador do "warrant", se este foi negociado, ou do saldo à sua disposição se a mercadoria foi vendida, observando-se o processo do § 2º, que correrá perante o juiz do comércio em cuja jurisdição se achar o armazém geral.
§ 2º - O interessado requererá a notificação do armazém geral para não entregar sem ordem judicial a mercadoria ou saldo disponível no caso de ser ou de ter sido ela vendida, na conformidade dos artigos 10, § 4º, e 23, § 1º, justificará sumariamente a sua propriedade.
O requerimento deve ser instruído com um exemplar do jornal em que for anunciada a perda e com a cópia fiel do talão do título perdido, fornecida pelo armazém geral e por este autenticada.
O armazém geral terá ciência do dia e da hora da justificação e para esta, se o "warrant" foi negociado, e ainda não voltou ao armazém geral, será citado o endossatário desse título, cujo nome devia constar do correspondente conhecimento do depósito perdido (art.19, 2ª parte).
O juiz, na sentença que julgar procedente a justificação, mandará publicar editais com 30 dias para reclamações.
Estes editais produzirão todas as declarações constantes do talão do título perdido e serão publicados no "Diário Oficial" e no jornal onde o interessado anunciou a referida perda e afixados na porta do armazém e na sala de vendas públicas.
Não havendo reclamação, o juiz expedirá mandado conforme o requerido ao armazém geral ou depositário, sendo ordenada a duplicata, dela constará esta circunstância.
Se, porém, aparecer reclamação, o juiz marcará o prazo de dez dias para prova, e, findo estes, arrazoando o embargante e o embargado em cinco dias cada um, julgará afinal com apelação sem efeito suspensivo.
Estes prazos serão improrrogáveis e fatais e correrão em cartório, independente de lançamento em audiência.
§ 3º - No caso de perda do "warrant", o interessado que provar a sua propriedade tem o direito de receber a importância do crédito garantido.
Observar-se-á o mesmo processo do § 2º, com as seguintes modificações:
a) - Para a justificação sumária, serão citados o primeiro endossador e outros que forem conhecidos. O armazém será avisado do dia e hora da justificação e notificado judicialmente da perda do título.
b) - O mandado judicial de pagamento será expedido contra o primeiro endossador ou contra quem tiver em consignação ou depósito a importância correspondente à dívida do "warrant".
O referido mandado, se a dívida não está vencida, será apresentado àquele primeiro endossador no dia do vencimento, sendo aplicável a disposição do art.23 no caso de não pagamento.
§ 4º - Cessa a responsabilidade do armazém geral e do devedor quando, em virtude de ordem judicial, emitir duplicata ou entregar a mercadoria ou saldo em seu poder ou pagar a dívida. O prejudicado terá ação somente contra quem indevidamente dispôs da mercadoria ou embolsou a quantia.
§ 5º - O que fica disposto sobre a perda do título aplica-se aos casos de roubo, furto, extravio ou destruição.
CAPÍTULO III
Sala de vendas públicas
Art. 28 - Anexas aos seus estabelecimentos as empresas de armazéns gerais poderão ter salas apropriadas para as vendas públicas, voluntárias, dos gêneros e mercadorias em depósito, observando-se as seguintes condições:
§1º - Estas salas serão franqueadas ao público, e os depositantes poderão ter aí exposição de amostras.
§2º - É livre aos interessados escolher o agente da venda dentre os corretores ou leiloeiros da respectiva praça.
§3º - A venda será anunciada pelo corretor ou leiloeiro, nos jornais locais, declarando-se o dia, hora e condições do leilão e da entrega da mercadoria, número, natureza e quantidade de cada lote, armazém onde se acha, e as horas durante as quais pode ser examinada.
Além disso, afixará aviso na praça do comércio e na sala onde tenha de efetuar a venda.
§4º - O público será admitido a examinar a mercadoria anunciada à venda, sendo proporcionadas todas as facilidades pelo administrador do armazém onde ela se achar.
§5º - A venda será feita por atacado, não podendo cada lote ser de valor inferior a dois contos de réis, calculado pela cotação média da mercadoria.
§6º - Se o arrematante não pagar o preço marcado nos anúncios, e, na falta destes, dentro de vinte e quatro horas depois da venda, será a mercadoria levada a novo leilão por sua conta e risco, ficando obrigado a completar o preço por que o comprou e perdendo em benefício do vendedor o sinal que houver dado.
Para cobrança da diferença terá a parte interessada a ação executiva dos arts. 309 e seguintes do Decreto nº 737, de 25 de novembro de 1850, devendo a petição inicial ser instruída com certidão extraída do livro do corretor ou agente de leilões.
§7º - Tratando-se das mercadorias a que se refere o art. 12, observar-se-á o disposto no §1º nº 1, do mesmo artigo.
Art. 29 - Onde existirem salas de vendas públicas serão nelas efetuadas as vendas de que tratam os arts. 10, §1º, e 23, §1º, não sendo então aplicável a disposição restritiva do art. 28, §5º.
CAPÍTULO IV
Disposições fiscais e penais
Art. 30 - São sujeitos ao selo fixo de trezentos réis:
1º - O recibo das mercadorias depositadas nos armazéns gerais (art. 6º).
2º - O conhecimento de depósito.
O mesmo selo das letras de câmbio e de terra pagará o "warrant" quando separado do depósito for pela primeira vez endossada.
Art. 31 - Não podem ser taxados pelos Estados nem pelas Municipalidades os depósitos dos armazéns gerais, bem como as compras e vendas realizadas nas salas anexas a estes armazéns.
Art. 32 - Incorreção na multa de 200$ a 5:000$ os empresários de armazéns gerais que não observarem as prescrições dos artigos 5º, 7º e 8º §§1º a 4º, 13, 22, §3º, 24, §§1º e 4º, 26, §2º última parte.
§único - A multa será imposta por quem tiver a seu cargo a fiscalização do armazém, e cobrada executivamente por intermédio do ministério público, se não for paga dentro de oito dias depois de notificada, revertendo em benefício das misericórdias e orfanatos existentes nas sedes dos armazéns.
Art. 33 - Será cassada a matrícula (art. 1º, §1º) ou revogada a autorização (art. 4º), por quem o ordenou ou concedeu nos casos seguintes:
1º - falências e meios preventivos ou liquidação da respectiva empresa;
2º - cessão ou transferência da empresa a terceiro sem prévio aviso à Junta Comercial, ou sem autorização do Governo, nos casos em que esta for necessária;
3º - infração do regulamento interno em prejuízo do comércio ou da Fazenda Nacional.
§único - A disposição deste artigo não prejudica a imposição das multas cominadas no art. 32, nem a aplicação das outras penas em que, porventura, tenham incorrido os empresários de armazéns e seus prepostos.
Art. 34 - As penas estabelecidas, para os casos dos artigos 32 e 33, nºs 2º e 3º, só poderão ser impostas depois de ouvidos o empresário do armazém geral, o gerente ou superintendente das companhias de docas e os concessionários de entrepostos e trapiches alfandegados, em prazo razoável, facultando-se-lhe a leitura do inquérito, relatório, denúncia e provas colhidas.
Art. 35 - Incorrerão nas penas de prisão celular por um ou quatro anos e multa de 100$ a 1:000$000:
1º - Os que emitirem os títulos referidos no capítulo II, sem que tenham cumprido as disposições dos arts. 1º e 4º, desta lei.
2º - Os empresários ou administradores de armazéns gerais que emitirem os ditos títulos sem que existam em depósito as mercadorias ou gêneros neles especificados; ou que emitam mais de um conhecimento de depósito e de "warrant" sobre as mesmas mercadorias ou gêneros, salvo os casos do art. 20.
3º - Os empresários ou administradores de armazéns gerais que fizerem empréstimos ou quaisquer negociações por conta própria ou de terceiro, sobre os títulos que emitirem.
4º - Os empresários ou administradores de armazéns gerais que desviarem, no todo ou em parte, fraudarem ou substituírem por outras, mercadorias confiadas a sua guarda, sem prejuízo da pena de prisão de que trata o art. 11, nº 1.
5º - Os empresários ou administradores de armazéns gerais que não entregarem em devido tempo, a quem de direito, a importância das consignações de que trata o art. 22 e as quantias que lhes sejam confiadas nos termos desta lei.
§1º - Se a empresa for sociedade anônima ou comanditária por ações incorrerão nas penas acima cominadas os seus administradores, superintendentes, gerentes ou fiéis de armazéns que para o fato criminoso tenham concorrido direta ou indiretamente.
§2º - Se os títulos forem emitidos pelas repartições federais de que tratam os artigos 2º e 3º, incorrerão nas penas acima os fiéis ou quaisquer funcionários que concorreram para o fato.
§3º - Nesses crimes cabe a ação pública.
CAPÍTULO V
Disposições gerais
Art. 36 - Ficam compreendidas na disposição do art. 19, §3º, do Decreto nº 737, de 25 de novembro de 1850, os depósitos nos armazéns gerais e as operações sobre os títulos que as respectivas empresas emitirem e os contratos de compra e venda a que se refere o art. nº 28.
Art. 37 - São nulas as convenções, ou cláusulas que diminuam ou restrinjam as obrigações e responsabilidades que, por esta lei, são impostas às empresas de armazéns gerais e aos que figurarem nos títulos que elas emitirem.
§único - Ao contrário, podem os armazéns gerais se obrigar, por convenção com os depositantes e mediante a taxa combinada, a indenizar os prejuízos acontecidos a mercadorias, por avarias, vícios intrínsecos, falta de acondicionamento e mesmo pelos casos de força maior.
Esta convenção, para que tenha efeitos para com terceiros, deverá constar dos títulos de que trata o art. 15.
Art. 38 - A presente lei não modifica as disposições do capítulo V, do título III, da parte I, do Código Comercial, que continuam em inteiro vigor.
Art. 39 - Revogam-se as disposições em contrário.
Rio de Janeiro, 21 de novembro de 1903, 15º da República.
Francisco de Paula Rodrigues Alves
Leopoldo de Bulhões |